domingo, 20 de março de 2011

A -curta- História do Cachorro que não sabia Latir

Como era belo o cãozinho, era todo branco exceto por uma das patinhas, que era alaranjada. Apesar de não ter pedigree ou certificado de isso ou aquilo, era um cachorro bonito. Não precisava ter mãe e pai iguais para ser bonito, não precisava do papelzinho com assinatura do Ilmo Senhor Zefrédio Sinuto, veterinário respeitado, para simplesmente ser ele, do jeito que ele era. Nunca tomou banho de banheira de hidromassagem com pétalas de rosa, mas seu pêlo era tão bonito. Mas o que deixava o cãozinho mais belo era sua postura, um cão elegante, um canino Inglês.
Cuidava a rua parado na antecerca da casa, com o peito estufado, cena de propaganda de seguro de vida. Ele tinha um dinossauro de borracha, seu amigo e brinquedo de todos os dias. E todos os dias ele via cerca de 700 pessoas irem e virem, fora as que passavam em só um sentido, uma só vez. Ou aquelas que passavam nas terças e nas quintas, e aquelas que passavam só nas sextas. E lembrava até daqueles que nunca passaram. Quanta gente diferente o cachorrinho via. Pessoas que passavam em carros, a pé, em bicicletas, skate, e até aquele pequeno avião que cruzava a cidade todo dia exatamente as 6:50 da manhã. Gente barbuda, gente com guarda-chuva, gente ouvindo música, gente conversando, gente suja, pessoas sujas, a mãe com a criança no carrinho, o irmão levando a mochila da irmã menor, o guarda, o ônibus e tanta gente dentro dele. Mas era muita gente, talves o dobro de 700! Talves 100 vezes mais, mas o cachorrinho não sabia contar até mais que dez. Mas a pior coisa do cachorrinho é que ele não conseguia latir. Ele via aquele monte de gente e queria poder falar com todas, ouvir todas e se possível ajudá-las. Mas ele não conseguia latir, muito menos falar, pois cachorrinhos não falam. Ele via aqueles outros cachorros passando na rua e tentava chamá-los, mas não conseguia, eles não ouviam nada, aliás ouviam sim, eles sempre conversavam entre si. E o pobre cãozinho lá, sem latir. Sem latir e preso naquela casa. Sim, é isso! Ele não sabe latir porque não conhece o mundo!
Se ele conhecesse o mundo, fosse pra rua com os outros cachorros ele saberia latir! Ele imaginava que aquilo o tornaria um cachorrinho sujeito homem. Então ele decidiu, iria tentar fugir, pular a cerca. Mas impossível, a cerca era muito alta, tinha quase um metro. Então naquela mesma tarde seu dono chegou, abriu o portão, colocou o carro na garagem como em todos os dias, da mesma forma. Mas a roda do carro passou por cima do dinossauro de brinquedo e fez com que o dono do cãozinho juntasse as partes e fosse até a lata de lixo colocar.
O portão ficou ali, escancarado, aberto, e o cachorrinho ficou parado em frente ao seu sonho, o mundo real. Eram alguns passos para a liberadade total. Mas ele não foi, ficou ali, 4 minutos, imóvel, e decidiu não sair.

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